grindcore morto

Mais Médicos, Menos revista veja, menos globo, menos josé serra...

"O MILAGRE VEIO DE CUBA"
"OS CUBANOS SÃO BEM-VINDOS"
[ REVISTA VEJA EM 1999, A RESPEITO DA VINDA DE MÉDICOS CUBANOS PARA O BRASIL ]

A trincheira que divide nossas classes sociais podem bem ser representadas por um abismo, de modo que os de um lado mau podem perceber as nuances de quem está do outro. Nessa nossa representação, vamos acrescentar que um bom recurso para se fazer perceber é, por exemplo, o uso objetivo da mídia televisiva. Assim, embora não possam se ver e se escutar a olhos e ouvidos nus, pela tela a televisão a coisa muda. Um dos lados agora se faz ver e ouvir, defende seus interesses, lança seus argumentos... 
E quanto ao outro lado?
Sem chance. 
Sem poder econômico, não se faz ver, não se faz ouvir, não se faz perceber, não tem nuance. 


Estamos diante de uma destemida e aberta defesa de classe nesse instante tão específico da vinda dos médicos cubanos para atuação em áreas distantes no país. No lado de lá do abismo, a elite representada pela figura da "classe médica" (Conselho Federal de Medicina e Associação Médica Brasileira) se desdobrou em gritos, ofensas, histeria; supôs-se uma tentativa de revolução marxista em território brasileiro (??), chacotas quanto ao grau de formação desses médicos, passeatas com seus malditos e ridículos cartazes cheios de dizeres típicos de twiter e facebook, comitivas trajando seus jalecos e equipamentos prontas para receber esses médicos no aeroporto e os vaiar - e isso é sério! ... 
Foto da página Brasil 247, médico cubano sendo vaiado.
(isso mesmo, esse é o nível imaturo e absurdo com que as elites tratam o assunto) 

Enquanto os do lado de cá do abismo vão sendo abandonados à morte como se fossem encarcerados de campos de concentração, deixados ao abandono sistemático, destruição de seu direito à vida, isso não parece ter qualquer relevância para quem endossa e participa desses protestos. Mas para não dizer que não dão importância, dão sim. Essas famílias são matéria-prima para essa indústria que lucra da miséria. Diferente dessa elite indignada, esses povos situados tão longe e sem nenhum atendimento médico não cogitam cor de pele, não cogitam nacionalidade, não cogitam nem classe social... Apenas querem atenção, atendimento e tratamento médico. Ponto. 

Um bom outro ponto a se mencionar e que vai passando batido  de todos é que essa prática/tática de busca por serviços estrangeiros de atendimento médico não é setorizada do Brasil - Lugares no mundo, bem mais favorecidos do que o nosso, feito Canadá, Austrália, Inglaterra têm desse mesmo modelo de ação - e também não é novidade no por aqui. Esse é o "bom outro ponto". 
A ala conservadora, tosca, paupérrima de argumentos válidos, encabeçada por figuras feito eliane cantanhêde, reinaldo azevedo, noblat... certamente tem a memória, a informação e o conceito de que anos atrás, sob comando de fernando Henrique kkkardoso o mesmo foi feito, em escala menor. À época, josé serra, então ministro da saúde,não considerava a medida  "destemperada" nem "um tiro no pé (...) um tiro de canhão, não (...) um tiro de revólver"...

A sempre irrisória e descartável revista veja (em sua eterna precariedade de termos e consistência), hoje chega aos cúmulos preconceituosos de tratar os cubanos trazidos para cá de  "escravos de jaleco do Partido Comunista", pérola de reinaldo azevedo... mas em sua edição 1620, de 20 de outubro  de 1999 tratou a vinda dos médicos para a região de Tocantins com tapete vermelho na recepção.  Em 99 foram mais de 100 médicos trazidos e que trabalharam por alguns anos, até que tiveram seus contratos revogados. 

"O milagre veio de Cuba". "Faltavam médicos que quisessem aventurar-se naquele fim de mundo". Daí, o município de Arraias "conseguiu importar cinco médicos da ilha de Fidel e, assim, abrir as portas do hospital". Em algum momento se lê que "os cubanos são bem-vindos"...

Em 2002, o Ministério da Saúde e o governo do Tocantins entraram em convênio com o Ministério da Saúde de Cuba e contrataram 210 médicos, 40 enfermeiros e oito técnicos cubanos para os hospitais públicos da região. José Serra era o ministro da saúde de então.

Contudo, agora não estamos mais sob um regime político que favorece redações feito as da veja ou d'o globo tanto quanto esses gostariam. Não que não favoreça, apenas não tanto quanto gostariam, à la tio patinhas nadando na piscina de moedas de sua caixa-forte.

Nesse meio tempo, para suprir o modelo adotado pelo país, em que o ideal é de 2,7 médicos para cada mil habitantes, precisaríamos contar com 168.424 profissionais a mais do que os que já tem. 
Será que temos noção de quando essa meta pode ser atingida, devido ao passo lento em que a coisa toda caminha?
Sim, temos sim.
2035.

Para que sua e nossas mães, seus e nossos filhos tenham alguma perspectiva de ser atendidos, na ótica da elite que tem comandado, mandado e desmandado os setores de saúde daqui, leva no mínimo 22 anos... 
Para a sorte do saudável e reforçado café da manhã dessas elites nossa desgraça, fedorenta, purulenta desgraça não pode ser sentida do outro lado desse abismo/dessa trincheira.


Referências para esse texto:
Brasil 247

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